Ghost of Tsushima – Valeu a pena esperar por este conto Samurai?

Ghost of Tsushima era um dos jogos mais antecipados do ano, mas envolto em muitos pontos de interrogação sobre a jogabilidade. Valeu a espera?  E vale o full-price de lançamento?

Ghost of Tsushima é um Action-Adventure e Openworld desenvolvido pela Sucker Punch e publicado pela Sony Entertainment Interactive, em exclusivo para a Playstation, que promete aproximadamente 50 horas de jogo, o que é bastante razoável.

Tsushima é uma ilha do Japão, que fica entre o seu território principal e a costa da Coreia. A narrativa de Ghost of Tsushima é inspirada em eventos históricos e tem lugar durante a invasão Mongol do Japão, em 1274. O jogo começa com uma pequena força de Samurais a tentar deter o desembarque do número massivo de mongóis e a encontrar, apenas, uma honrosa morte em combate.

Aqui, terminam as ligações fiéis à história e entramos de imediato no campo ficcional. Jogamos como Jin Sakai, um Samurai que sobrevive a esta batalha e se vai tornando num herói e lenda para as pessoas da ilha, conhecido pelas suas tácticas de batalha e capacidade de provocar o medo entre as hostes mongóis. Uma grande parte do jogo acompanha  o seu processo de transformação no Ghost, à medida que vai libertando a terra dos invasores e a sua lenda aumenta.

Apesar da história ser ficcional, o mundo parece-nos extremamente real. Entre o que o nosso imaginário colectivo nos diz do Japão feudal e como ele realmente era, o mundo de Ghost of Tsushima  faz-nos sentir transportados para aquela realidade. E a plausibilidade histórica do mundo ajuda-nos a sentir a história do jogo como real, como se do contar de uma lenda passada se tratasse. Um pormenor interessante é que os mongóis eram conhecidos por estudar meticulosamente os seus inimigos, de forma a melhor os combater. Isso é-nos constantemente lembrado nos diálogos com o antagonista, Khotun Khan, que, não só fala japonês, como é familiar com o código Samurai e assim consegue prever o que irão fazer.

É, aliás, esse o principal motor que leva Jin Sakai a adoptar métodos que vão contra o próprio código pelo qual sempre viveu, de forma a conseguir ter hipóteses de sucesso. Este não seria um jogo de Samurais se a honra não estive sempre presente e a Sucker Punch fá-lo de forma brilhante. A forma como o nosso personagem se debate entre combater de forma honrosa ou servir-se de técnicas próprias de um ladrão e assassino dá um sabor intenso à história. Somos constantemente lembrados que o mundo não é preto e branco e que não há respostas simples. O dilema de Jin passa para nós e, como jogador, questionamo-nos também sobre até onde se justifica ir para conseguir a vitória.

Por falar em preto e branco, são amplamente conhecidas  as influências do cinema japonês de samurais e, em particular, do realizador Akira Kurosawa, em Ghost of Tsushima. A Sucker Punch oferece-nos vários modos de experienciar este jogo: normal (a cores e com voice-acting em inglês); normal legendado; Samurai cinema (a cores, com voice-acting em japonês e legendado em inglês); Kurosawa Mode (a preto e branco, como nos filmes do realizador de 7 Samurais, com voice-acting em japonês e legendado em inglês). Qualquer modo é uma boa escolha, mas tenho de dizer que as vozes em japonês contribuem imenso para o ambiente e a imersão no jogo.

Comparação do visual a cores com o Modo Kurosawa

O primeiro impacto que temos com Ghost of Tsushima, que é, aliás, algo que sempre foi uma certeza sobre o jogo, antes ainda de conhecermos gameplay, é que os visuais são extraordinários. Este é, provavelmente e na minha opinião, o jogo com melhores visuais de todo o ciclo de vida da PS4. Aqui, ultrapassamos o debate de comparação de cenários com outros jogos. E mesmo se escolhêssemos esse caminho, os cenários são fenomenais e diferenciados. Mas é muito mais que isso! É todo o ambiente criado. Tudo mexe, desde as árvores às ervas altas. Sentimos o vento e o mundo de uma forma que ainda não tinha experienciado em qualquer videojogo. A forma como isso nos ajuda a imergir no jogo serve a narrativa de uma forma notável e é tão poético como todo o imaginário Samurai.

O audio acompanha o visual e os efeitos sonoros e composição musical também fenomenais. A utilização de música em certos momentos do jogo roça a perfeição e sentimos, como jogadores, todas as emoções que a Sucker Punch pretende, desde tristes a zangados ou excitados pelo combate que está a começar. Fica apenas a desilusão pela ausência de sincronização de lábios com o audio japonês, que é um factor que pode levar muita gente a escolher jogar em inglês. Eu mantive-me fiel à opção de jogar com o voice-acting japonês e não me arrependo, pois contribui imenso para o ambiente e rapidamente deixamos de reparar na dessincronização (até porque temos de ler as legendas e com isso não olhamos para a boca dos personagens).

O gameplay de Ghost of Tsushima é, em grande parte, semelhante a vários jogos do género: exploramos a ilha de Tsushima, um open world enorme, muito do tempo a cavalo, com os principais pontos do enredo claramente marcados no mapa e com as sidequests e outros locais que recompensam o nosso personagem a serem revelados, à medida que exploramos. Somos livres de, no geral, fazer as coisas pela ordem que queremos e o desafio que nos é colocado pelos encontros escala bem, sem nunca sentirmos que é demasiado fácil ou impossível.

É, contudo, nas diferenças para os restantes jogos do género, que Ghost of Tsushima se destaca. E essas diferenças estão na forma como a história é contada e o combate se processa.

A história é-nos contada sobre a forma de contos. Cada quest que fazemos é-nos apresentada como um conto, narrando um feito em particular de Jin Sakai, que contribuiu para o crescimento da sua lenda. É, aliás, através da mecânica de crescimento da nossa lenda que fazemos upgrades e desbloqueamos novas habilidades. Esta forma de contar a história leva-nos também para o imaginário dos filmes de samurais. Os momentos narrativos são interessantes, bem escritos, repletos de emoções e levam-nos sempre a querer avançar na história.

O combate é rápido e visceral, com  um feeling muito O Último Samurai. Como grande fan desse filme, dei por mim a vibrar muitas vezes com algumas semelhanças. Ao jogar este jogo queremos sentir-nos um Samurai e Ghost of Tsushima entrega-nos esse desejo numa bandeja, em todas as animações e efeitos sonoros. Não é um combate extremamente desafiante. Vão haver dificuldades e morremos algumas vezes, mas é, no global, acessível e isento de frustrações. Muitas vezes sentimos que o que está em causa não é o se vamos conseguir vencer a batalha, mas sim a forma e a eficiência com que o vamos fazer.

Uma das coisas que, para mim, está mais bem conseguida em Ghost of Tsushima é o equilíbrio entre jogar como Samurai ou Shinobi (ninja). A maioria dos jogos do género acaba por, mesmo que inadvertidamente, premiar um estilo de jogo mais stealth, castigando quem se atrever a enfrentar de peito aberto algum encontro. Aqui, é realmente uma escolha do jogador o seu estilo de jogo. Se, aproveitar as sombras para assassinar os inimigos um a um, apresenta as suas vantagens e parece mais isento de perigos, a mecânica de standoff, em que entramos pelo portão da frente e desafiamos o melhor guerreiro adversário para duelo, permite-nos logo eliminar algumas ameaças, ao bom estilo samurai, antes de lidar com os restantes inimigos. Os dois modos estão, de facto, perfeitamente equilibrados e o jogador é livre de escolher o caminho mais honroso, mais infame ou misturá-los a seu prazer.

Ao longo do jogo adquirimos novas habilidades e posturas, que podemos usar para tornar o combate mais interessante a ajudar a derrotar os adversários de forma mais eficiente. Podemos também melhorar o nosso equipamento e até customizar a sua aparência.

Os controlos são rápidos de dominar e são-nos ensinados por um tutorial muito bem desenhado pela Sucker Punch, que, não só não parece um tutorial na sua estrutura, como nos agarra logo à história, pela sua narrativa. Vamos aprendendo a controlar Jin de forma natural e bem integrada no jogo.

Ghost of Tsushima é uma experiência única. O mercado precisava de um bom jogo de samurais e a Sucker Punch entregou-nos um objecto extraordinário. Da mesma forma que o filme O Último Samurai é, por muito bem sustentado que seja, uma visão muito ocidentalizada do Japão feudal, longe da genuinidade dos 7 Samurais, de Kurosawa, mas extremamente gratificante de ver, também este jogo nos oferece esse sentimento and I simply love it!

Conclusão:

Ghost of Tsushima agarra o jogador logo no primeiro momento, com uma história bem contada e um ambiente imersivo como nunca experienciei noutro videojogo, construído por uma combinação irrepreensível de componentes visuais, audio e narrativas fenomenais. O combate é extremamente gratificante e divertido, deixando-nos com um feel good feeling no final de cada encontro. Não só valeu a espera e vale cada cêntimo do seu full-price, como é, indubitavelmente, um sério candidato a Jogo do Ano e um jogo que certamente figurará na minha lista de jogos favoritos de todos os tempos.