The Medium – Um jogo, dois mundos

Resolver enigmas, ser perseguido por monstros em dois mundos distintos e tendo como única hipótese correr… Não achei que The Medium fosse para mim…

A minha antecipação em relação a The Medium estava mais relacionada com ser o primeiro título exclusivo a ser lançado na nova geração das consolas Microsoft. Este género não vai, de todo, ao encontro das minhas preferências. Gosto de jogos com ação, em que podemos evoluir o personagem e usar as armas que preferirmos. A título de exemplo, quando jogo RPG’s, tenho tendência a fazer personagens “tanque” que aguentem muito dano e possa ir para o meio do combate. Em The Medium a mecânica é totalmente diferente, mas já lá chegaremos.

O jogo foi desenvolvido pela Bloober Team, responsável por títulos como The Observer, Blair Witch ou Layers of Fear, o que, logo à partida, nos diz que são peritos em criar boas atmosferas.

Protagonizamos Marianne, uma rapariga cujo passado desconhecemos, mas que percebemos ser conturbado e com alguma infelicidade à mistura, embora muito pouco nos seja revelado. Iniciamos a narrativa na casa de seu falecido pai adotivo, onde procuramos um objecto, através do qual o jogo nos explica as suas simples mecânicas.

Propositadamente, não tive grande contacto com detalhes do jogo além de um trailer. Imediatamente fui brindado com uma dose de nostalgia. Ao tomar o controlo de Marianne, deparo-me com um ambiente tridimensional, eximiamente detalhado, mas cuja navegação é feita entre ambientes onde a câmara pouco ou nada se move, o que imediatamente me remeteu para o primeiro Resident Evil. Esta opção estética foi claramente propositada e não por restrições técnicas e, embora funcione muito bem, foi algo com que lutei durante grande parte do inicio do gameplay.

Após essa fase inicial, começamos a perceber mais sobre as capacidades de Marianne, que se consegue mover entre o mundo dos vivos e o dos espíritos, onde cada espaço tem a sua versão do mundo oposto, mais negra e cujos elementos são versões mais disformes da sua congénere. É nesta dualidade de mundos que o jogo se demarca dos restantes. Numa excelente manifestação de capacidade técnica, o motor gráfico renderiza dois mundos ou mesmo tempo, num ecrã dividido horizontalmente ou verticalmente, onde podemos ver ambas as realidades em que Marianne se move e nas quais esta repete os mesmos gestos, sendo que, geralmente, apenas numa delas interage com algo, enquanto que na outra apenas mimetiza os movimentos.

A aventura tem o seu verdadeiro início no hotel Niwa, algures na Polónia, para onde Marianne é atraída através de uma misteriosa chamada telefónica. Ao entrarmos no espaço, a nossa personagem divide-se então entre os dois mundos, e assim passa grande parte do tempo, resolvendo puzzles de forma a que consiga ultrapassar obstáculos de um mundo ou outro. Isto porque, embora os mundos sejam análogos, num deles, por exemplo, um lance de escadas está transitável, enquanto no outro não, o que impossibilita a personagem de continuar por esse caminho, pois ambas funcionam em simultâneo.

Os puzzles são resolvidos com recurso a outras mecânicas, como experiências extra corporais ou navegação apenas num mundo de cada vez, sendo que apenas podemos trocar de realidade em pontos específicos do jogo, o que revela que The Medium foi muito bem pensado e conceptualizado. Estas mecânicas funcionam muito bem e são, sem dúvida, um dos pontos fortes do jogo.

No desenrolar da aventura, vamos sabendo mais sobre a história e o que se passou no Hotel, recolhemos objectos para ultrapassar desafios e até os podemos combinar. Os cenários estáticos e o recolher, analisar e combinar de objectos  fez-me muito lembrar as aventuras point & click, que certamente foram inspiração.

A nível de ambientes, o jogo supera o que esperava. São extremamente detalhados, mas, ao mesmo tempo, de simples navegação, nunca fazendo o jogador sentir-se assoberbado de informação ou opções. O tom negro e decrépito conferido ao mundo real contrasta muito bem com os tons ocre do mundo dos espíritos.

A história é linear, o que não a torna menos interessante. Para os verdadeiros apreciadores do género, ainda tem umas cenas muito bem feitas, que provocam uns bons jump scares ou alguma adrenalina. A nível puramente estético, não tenho nada a apontar pela negativa. Mas devo dizer que foi brilhante a opção de colocar os espíritos com máscaras brancas, sem expressão, dando uma sensação de estarem perdidos no tempo.

Conclusão:

Para uma história relativamente curta, The Medium tem muito que se lhe diga. Revela uma grande atenção ao detalhe, tanto nos cenários e ambiente, como no tratamento das histórias e motivações das personagens. Embora faça certamente as delicias dos amantes do género, será sem dúvida uma experiência que recomendo a qualquer jogador. Mesmo aqueles que, como eu, estejam mais virados para jogos em que se possa retaliar sobre um inimigo e a única opção não seja fugir…