Baseado na obra homónima da autoria de Franz Kafka, Metamorphosis é um puzzle game na primeira pessoa em que não se deve confiar, para o bem ou o mal, nas primeiras impressões.
As obras literárias têm um longo historial de serem adaptadas a versões cinematográficas, desde Harry Potter, Lord of The Rings, The Hunger Games, entre muitos, muitos outros exemplos. As críticas dos mais puristas, que tomaram conhecimento dos mundos criados nos livros, através da leitura costumam ser frequentes e remetem, habitualmente, para o facto de as adaptações em filme não conseguirem fazer total justiça ao que tinha sido a percepção do leitor na altura da leitura. Quanto aos videojogos, para além de vários terem sido recriados com base nas versões do cinema que, por si só, já eram inspirados nos livros (imensos jogos das sagas de J.K. Rowling e Tolkien existiram ao longo dos anos e mais virão por aí), clássicos como Rainbow Six, The Witcher ou o injustamente “esquecido” Dante’s Inferno, entre outros, saltaram directamente do papel para o controlo dos jogadores, sendo que aqui, dada a diferença de géneros dos próprios jogos (desde acção\aventura, third\first person shooters e RPG), orçamento e outros factores, uns foram melhor recebidos pela crítica e pelos jogadores, do que outros.
No livro “A Metamorfose”, publicado em 1915, a personagem principal é Gregor Samsa e em Metamorphosis, também. É igualmente semelhante o clímax ocorrer logo no início dos eventos, ou seja, o protagonista desta história, certo dia, acorda metamorfoseado num insecto, não sendo no livro descrito de forma cristalina que insecto é, mas, no jogo, assumimos o controlo de uma barata. A partir daqui, qualquer parecença entre o videojogo e a obra escrita é inexistente, já que a demanda que a produtora Ovid Works desenvolveu levar-nos-á em busca da retoma da nossa forma humana.
Ao estar na pele de uma barata minúscula, todo o cenário do jogo é um obstáculo gigante para para Gregor, desde cadeiras, lápis, canalizações, seres humanos, etc., o que constitui parte central em toda a experiência de Metamorphosis. O aspecto do mundo de jogo não se destaca por aí além, diria que graficamente existiram jogos na geração anterior de consolas que conseguiram melhor aparência dentro das produções desta dimensão, ou seja, indie games, com uma aposta num tom surrealista, muito à custa das imensas baratas e outros insectos e as tarefas que vão executando.
Como parte da metamorfose ocorrida, a voz humana também se perdeu. O, vá lá, “baratês” que passou a ser a maior parte do som da campanha, tornou-se tremendamente irritante à medida que se ia ouvindo cada vez mais. Quando a este “pormaior” se junta a repetição constante das poucas músicas que fazem parte da banda sonora, nomeadamente enquanto se tenta perceber qual a resolução de um puzzle para poder avançar, só pode ser considerado como um ponto negativo o campo sonoro de Metamorphosis.
Os puzzles são o centro da acção, alguns deles levando mais tempo do que seria necessário caso não fosse mais complicado do que deveria, caso a construção dos níveis tivesse sido pensada de outra forma, pois a perspectiva na primeira pessoa, ao nível do chão, ou seja, levando a que haja uma necessidade de olhar sempre em frente ou demasiado para cima, associado à susceptibilidade de falhar vários saltos por causa da movimentação rápida e leve de uma barata, pode provocar frustração desnecessariamente. Destaco, no entanto, a única ferramenta que é possível utilizar, além de saltar e correr: passar as patas por cima de uma pinga pegajosa que permite a deslocação na vertical.
No decurso da história e objectivo principais, irão surgir tarefas mais ou menos secundárias, pois terão de ser cumpridas para avançar, havendo um incidente paralelo que desperta o interesse do jogador para se perceber qual a motivação e em que vai acabar, mas que não cumpriu com a expectativa criada, conseguindo chegar-se ao fim de forma precipitada e com a sensação de que mais haveria por explicar, tudo isto numa experiência curta que não dura mais que 3 ou 4 horas (com os períodos mais demorados na resolução de puzzles incluídos).
Conclusão:
Metamorphosis inspirou-se em “A Metamorfose”, de Kafka, para oferecer aos jogadores a possibilidade de controlar uma barata e, no fundo, fica-se por aí. Sem ligação ao que é descrito no livro, é um videojogo banal, curto e que não faz jus ao “material fonte” que, mais de um século depois ainda é citado e estudado em escolas e universidades de todo o Mundo, conseguindo inclusivamente em meia dúzia de loadings repetir citações do escritor, quando havia tanto por escolher. Utilizando precisamente uma delas, pois acho que se ajusta: “As primeiras impressões nunca são confiáveis.”.
Metamorphosis está disponível para Nintendo Switch, PlayStation 4, Xbox One e PC (a versão jogada foi a de PlayStation 4).
O meu primeiro contacto com os videojogos aconteceu por altura do meu 8º aniversário, quando recebi de prenda uma SEGA Mega Drive, ficando “agarrado” a jogos como “The Revenge of Shinobi” ou “Streets of Rage 3“. Anos mais tarde, tive a possibilidade de experimentar a primeira PlayStation, juntamente com o original “Spyro the Dragon”, jogando a todas as consolas da Sony desde essa altura (caseiras e portáteis). Nenhum jogo, até hoje, me marcou mais do que o Final Fantasy X, mas creio que o que mais horas joguei foi o PES 5, também na PS2. Adoro jogos de ação na 3ª pessoa, visual novels e RPG’s no geral (para indicar alguns géneros), mas tenho um fraquinho particular por turn-based JRPG.