Jogar, morrer, repetir. A minha primeira ideia acerca de Returnal é que não seria um jogo para mim. Confirmaram-se as expectativas?
Morrer e voltar a repetir missões é algo a que qualquer jogador está habituado. No entanto, podemo-nos sempre socorrer de save games ou checkpoints, que nos asseguram que o nosso progresso não se perde, evitando assim elevados níveis de frustração.
O que a Housemarque nos apresentou não só nos retira essa “segurança” como, de forma muito inteligente, a torna parte da experiência e narrativa daquilo a que só consigo chamar de um Groundhog day espacial. A diferença é que em vez de um meteorologista preso numa pequena cidade americana, condenado a viver o mesmo dia vezes sem conta, encarnamos uma astronauta que, ignorando todos os avisos para não o fazer, resolve investigar o planeta Atropos, acabando por entrar num ciclo de morte e regresso a um ponto do tempo onde um estranho e familiar sinal, a que dá o nome de White Shadow, a parece atrair para o planeta. A nossa personagem, Selene, acaba por se despenhar, dando por si num planeta hostil e estranho, obrigada a lutar contra criaturas hostis enquanto procura revelar a origem do estranho sinal que inicialmente a conduziu lá.
Cedo Selene encontra o cadáver de um astronauta e o mistério adensa-se quando percebe que o cadáver é o seu. Ao mesmo tempo iremos também procurar desvendar os mistérios de uma antiga civilização que aparentemente habitou Atropos, tendo deixado ruínas e artefactos para trás e que muita utilidade terão para nós.
Atropos
É inegável que Returnal é um deleite visual para os fãs de ficção científica e, no campo da atmosfera visual, a Housemarque leva nota máxima. Para mim foi impossível não perceber a inspiração no mundo de Alien e Prometheus. Tendo nascido nos anos 80 e, desde muito cedo, adquirido o gosto por grande obras do cinema Sci-fi (Alien foi foi ao mesmo tempo o meu maior trauma e felicidade), foi com grande emoção que comecei a explorar Atropos. Mais emocionado fiquei ao perceber que Atropos nos oferece seis biomas diferentes para explorar.
Sendo um roguelike, Returnal faz-nos passar aleatoriamente de área em área, e, enquanto algumas são mais simples e outras verdadeiras arenas com uma multiplicidade de inimigos, há outras que simplesmente nos surpreendem, como a que se pode ver ao minuto 1:05 do vídeo acima ou outra em que, do nada, nos deparamos com a casa de Selene que, aos poucos, podemos explorar.
Uma das razões que me levou a repetir várias vezes o ciclo de Returnal foi o quanto o argumento me agarrou. Cada ciclo que repetia desvendava um pouco mais do mistério e, passando o curto momento de frustração por ter de iniciar outro ciclo, rapidamente ganhava alento para descobrir um pouco mais. A própria personagem de Selene tem um ar enigmático e cedo percebemos que, por detrás do seu ar fechado, há algo a descobrir.
Mecânicas e gameplay
Returnal incentiva à exploração quer para progredir, quer para desvendar a história. Ao bom estilo roguelike, passamos de área em área de forma ir revelando mais e mais. Sendo que muitas vezes temos de voltar para trás pois já obtivemos os itens necessários para passar a uma área anteriormente vedada ( a casa de Selene é um desses casos e descobrir a chave pela primeira vez foi muito entusiasmante). De forma a navegar pelo mapa existem pontos de fast travel que, à medida que avançamos, se vão tornar muito úteis.
O combate consegue ser muito difícil, mas também estimulante. Desde que vi os primeiros videos de Returnal que os ataques das criaturas inimigas me fizeram lembrar alguns robots de Nier Automata, que lançavam uma série de bolas, que avançavam lentamente, mas quando combinadas com várias criaturas a atacar, ou outras com outros tipos de ataque, trazem um nível de dificuldade acrescida e muita adrenalina.
Aqui os reflexos são importantes e os movimentos de Selene estão muito bem conseguidos, e, embora simples (X para saltar e O para dash), são mais que suficientes para nos trazer uma experiência que muito facilmente se pode tornar frenética. Ao mesmo tempo temos de correr, evitar ataques, disparar e navegar na “arena”.
Cada dano recebido retira integridade ao nosso fato e conduz-nos, lentamente (ou não), a um novo ciclo. A integridade pode ser reposta com o item Silphium e o valor máximo desta pode ser aumentado preenchendo 3 slots com resin. E sim, ao morrer tudo se perde e voltamos ao ponto inicial.
A cada ciclo a nossa proficiência com as armas recomeça do zero e esta vai aumentado ao recolher itens próprios para o efeito ou conforme usamos as armas e eliminamos criaturas. A proficiência permite causar mais dano e encontrar armas mais poderosas, pelo que tem uma grande relevância no combate tanto à distância como em melee.
Pelo caminho recolhemos várias obolites e ether, que nos permitem fazer upgrades, fabricar artefactos e limpar itens malignos, que ao serem usados nos causam malfunctions e nos atribuem handicaps temporários. Destes dois apenas o ether permanece connosco de ciclo para ciclo, embora seja o elemento mais raro e difícil de obter, é útil para limpar itens malignos ou trocar por obolites . Outro elemento curioso são os parasitas, criaturas alienígenas que simbioticamente se agarram a Selene e têm sempre uma vantagem e uma desvantagem associadas, que bem aproveitados podem tornar o progresso muito interessante.
O gameplay também ganha muito ao tirar partido da nova geração. Que acontece quer a nível de rapidez do sistema, o constante repetir de ciclos não causam tanta frustração, quer a nível do DualSense, que nos faz sentir a chuva que cai ou como nos permite utilizar o tiro primário ou secundário dependendo da pressão que fazemos no L2.
Dificuldade
Returnal é difícil? Sim, sem dúvida. Mas, talvez por já saber o que me esperava, não é algo extremamente frustrante e a cada ciclo que se repete acabamos por saber sempre um pouco mais sobre Atropos, conhecendo melhor as áreas e inimigos. O que faz com em cada novo ciclo percamos menos tempo e, por consequência, demoremos menos tempo a alcançar o ponto em que ficámos no ciclo anterior.
Além disso existem checkpoints “não oficiais”, ao alcançar um boss deixamos de ter de percorrer todos os mesmos passos e a sua localização passa a estar mais perto do início do ciclo, contudo, é sempre recomendável ganhar proficiência e aumentar a integridade.
Conclusão:
Respondendo à minha pergunta inicial, não, as expectativas não se confirmaram e Returnal é uma experiência rica e desafiante, embora não deixe de nos fazer passar por momentos frustrantes. A Housemarque apostou num conceito pouco habitual em jogos AAA e o resultado foi indubitavelmente positivo. Vários jogadores têm vindo a queixar-se da dificuldade e já há pedidos de save points e checkpoints que o estúdio está a considerar seriamente. São pedidos válidos e cada um deve usufruir de um jogo da forma que mais satisfaça, eu, pessoalmente, prefiro usufruir da experiência da forma que foi inicialmente idealizada.
Returnal é um exclusivo PlayStation 5.
Começou a jogar num spectrum 48k e desde então tem uma paixão por videojogos, não imagina a sua vida sem jogar. Fã de RPGs, First Person Shooters e jogos Third Person, joga na sua PS5, Xbox Series S, PC e Nintendo Switch.