Aceitei uma sidequest e tive no Altice Arena para ver Cornucopia, o mais recente espetáculo de Björk.
Foi no dia 1 de Setembro que a artista islandesa agraciou Lisboa com a primeira data de uma digressão Europeia de Cornucopia, um espetáculo que estreou em maio de 2019 e já passou pela América do Norte, Oceânia e Ásia, e que foi pensado para o álbum Utopia (2017), embora já integrando músicas do mais recente trabalho Fossora (2022).
Nem sempre consegui acompanhar o seu vasto experimentalismo musical e nem tudo o que criou foi do meu inteiro agrado. Contudo, sou um grande apreciador da sua voz e tenho um grande respeito pela sua carreira.
Escrevo “concerto” no título deste artigo, mas depois não consigo repetir a palavra para me referir ao que assisti no Altice Arena. Björk Cornucopia traz-nos muito mais que isso. É um espetáculo multimédia, dirigido pela cineasta argentina Lucrecia Martel, que combina imagem, música, performance e a sua voz única, produzindo uma experiência imersiva de grande impacto.
Cheguei a tempo de assistir à atuação do The Hamrahlid Choir, um coro islandês que actuou à boca de cena, durante cerca de vinte minutos, e viria a integrar, mais tarde, o espetáculo. Por detrás do coro, uma cortina de cordas servia de tela de projecção de motivos florais, antevendo uma utilização criativa deste meio.
E não me enganava. O espetáculo começa com Björk e os seus músicos detrás desta cortina, num palco multidimensional, com vários níveis de altura e vários planos de profundidade. Imagens são projectadas na cortina de cordas, sobrepondo-se aos artistas, bem como no plano de trás, criando um espetáculo visual de grande impacto.
A natureza está sempre presente, mas em grande simbiose com a figura humana. É um imaginário orgânico onde aparecem novas formas resultantes desta fusão do ser humano com os elementos da natureza, sobretudo florais. De certa flora, lembra-me o devaneio visual do universo de Elden Ring. Todo o guarda roupa acompanha esta organicidade e opulência, atingindo o máximo da exuberância na protagonista.
Björk desloca-se entre os vários planos do palco, ora se escondendo por trás das projeções ou assumindo-se à boca do palco. O seu corpo faz parte de tudo o resto, fundindo-se e várias vezes até perdendo visibilidade. Mas a sua voz está lá sempre, única e poderosa, numa performance sublime.
Aqui sinto que o meu lugar no balcão lateral me está a prejudicar um pouco a imersão visual no espetáculo. Quase metade da projecção do fundo do palco e parte do palco estão cortadas do meu ângulo de visão. Neste espetáculo, ao contrário da maioria, uma visão central beneficia claramente o público, permitindo absorver melhor os vários planos de profundidade e ter uma perceção global e abrangente de tudo o que se passa em palco.
As várias músicas passam e o tom do espetáculo é visível em todo o público. Isto não é, de facto, um concerto. Não temos o público a cantar com Björk. Não há interação entre a artista e o público. Todo o Altice permanece em silêncio, notando-se apenas alguém a dançar aqui e ali, explodindo em aplausos entre cada momento musical. Não é porque não está a sentir-se envolvido, antes pelo contrário. O público sente a diferença e este é o tipo de comportamento que esperamos de um espetáculo de teatro, dança ou ópera. E Cornucopia bebe de tudo isto.
Associada à musica há uma mensagem permanente ligada à sustentabilidade, que chega mesmo a surgir escrita, projetada na cortina frontal: “Imagine a future. Be in it”. E como acontece com tudo que Björk faz, aqui também houve uma dose provocação. Depois de terminar o seu set principal, a ativista climática sueca Greta Thunberg aparece como uma projeção, dirigindo-se diretamente ao público e desafiando-o sobre a emergência climática.
É preciso esperar pelo fim do espetáculo para aparecer a interação entre o público e Björk. A ovação a pedir o encore é enorme. Lanternas dos telemóveis acendem-se por todo o Altice Arena. Björk agradece em português e visivelmente emocionada, com a voz a tremer, comenta “This is so beautifull” olhando para a plateia cheia de luz. Apresenta a banda e anuncia que iremos ouvir a última música.
Foram pouco menos de 2 horas de espetáculo. Björk Cornucopia traz-nos uma visão de um mundo futuro, uma visão positivista e mágica da artista islandesa, assente na sustentabilidade e fazendo uma apaixonada ode à natureza.
Começou a jogar ainda os jogos se carregavam a partir de uma cassete de fita magnética. Completamente viciado em FIFA, é também fã incondicional de RPGs e Jogos de Estratégia. Junta, aos videojogos, a paixão pelos jogos de tabuleiro.