Song of Horror deixou-me inquieta não só pela tensão em certos pontos do jogo… mas também por algumas falhas que apresentou.
A primeira vez que ouvi falar de Song of Horror foi em 2019 através de um Let’s Play no YouTube. Fiquei desde logo curiosa, mas como o gameplay tinha sido em PC e eu sou mais de jogar em consolas, não pensei mais nele… Até agora.
Song of Horror foi desenvolvido pela Protocol Games, estúdio nuestro hermano. Após não uma, mas duas tentativas falhadas de Kickstarter (e nota-se muito a paixão posta neste projeto quando se lê a descrição), a equipa não desistiu do seu sonho e finalmente em 2019 conseguiu lançar os dois primeiros episódios no Steam. O quinto e último episódio ficou disponível em Maio de 2020, e um ano depois a versão PlayStation 4 e Xbox One sai, em modo Complete Edition.
O título revela logo algo sobre o jogo – no centro da história está uma caixa de música amaldiçoada. Quem quer que oiça a sua melodia inquietante começa a experienciar alucinações que vão ficando progressivamente mais violentas, até ao ponto em que o ouvinte perde a cabeça (às vezes literalmente).
Começamos o jogo em 1998 como Daniel Noyer, a personagem principal e sem a qual a história não avança (já explico mais sobre esta mecânica um pouco mais à frente). Daniel trabalha para uma editora que está prestes a publicar o novo livro do autor Sebastian P. Husher, mas há um pequeno problema: ninguém ouve dele há dias. Como Daniel é um assistente (e perpetuando o preconceito que assistentes servem para todo o tipo de trabalho), Etienne, o seu patrão, manda-o à mansão Husher para perceber onde se encontra o autor. No meio da sua “investigação”, o nosso protagonista fica preso num sítio quiçá fora deste mundo – chamado Elsewhere – até que uma das outras personagens o encontre e a história possa continuar.
Song of Horror permite-nos jogar com 13 personagens diferentes. Em cada capítulo temos a escolha de uma (ou mais) personagem num pequeno grupo que nos é apresentado, cada uma com uma pequena biografia, um item com uma utilidade obscura (obrigada internet por desvendares esta parte), e as respetivas stats – uma personagem com mais Serenity demora menos tempo a acalmar-se, enquanto uma personagem com pouco Stealth atrai mais atenção e nos obriga a passar por mais encontros sobrenaturais.
O jogo avisa-nos que está desenhado para jogar com o modo permadeath – ou seja, se a personagem com que estamos a jogar morre… morre a sério. Não há save points que nos safem. Bye bye. Isto põe logo um grau de stress adicional, porque às vezes gostamos mesmo da personagem com quem estamos a jogar, e de repente… puff. Temos pena, tivesses mais cuidado. Se matarmos todas as personagens jogáveis de um capítulo, perdemos todo o progresso e temos de o recomeçar. Se o Daniel morre, perdemos todo o progresso e voltamos ao início do capítulo. Por uma questão de cautela, deixo sempre o Daniel como última escolha (no entanto há um troféu para completar um capítulo inteiro com o Daniel… dá vontade de arriscar). Há, no entanto, um modo que elimina a permadeath… mas qual é a piada?
Falando sobre isso, como é que estas mortes acontecem, qual é o verdadeiro perigo aqui? Uma entidade sobrenatural conhecida por The Presence: lovecraftiana, representada por escuridão, mãos, tentáculos… basicamente o material dos pesadelos. Ela manifesta-se através de pequenos jumpscares (que “apenas” aumentam o medo da nossa personagem, percetível através do áudio do bater do coração e da vibração do comando), e ataques que podem levar a uma morte instantânea ou a um mini-jogo altamente stressante de Quick-Time Events (que, se falhados, dão obviamente uma sentença de morte). A editora Raiser Games diz que este inimigo tem uma Inteligência Artificial que se adapta ao modo de jogar de cada pessoa, e é imprevisível a quantidade de vezes ou os sítios onde ela aparece – algo que confirmo através da comparação do meu playthrough com o do meu irmão (jogamos na mesma dificuldade com os mesmos personagens e tivemos experiências diferentes). Há várias maneiras de completar estes mini-jogos, desde pressionar freneticamente botões até coordená-los com a respiração do nosso personagem (sem dúvida o pior de todos para mim).
Song of Horror não é só feito de QTEs e exploração: temos muitos puzzles para resolver, e para juntarmos todas as peças temos de andar para trás e para a frente no mapa, como em Survival Horrors ao estilo de Alone in the Dark e Resident Evil (os originais). Ao início adorei navegar pela mansão do Capítulo I, sendo quase intuitivo o que fazer com o item acabado de encontrar. Mas à medida que avançamos nos capítulos e os mapas começam a ter mais áreas, os puzzles começam a tornar-se mais difíceis, ambíguos e frustrantes. Há certos enigmas que só se resolvem se prestarmos atenção a detalhes espalhados por documentos diferentes (que temos obrigatoriamente de encontrar) e outros cuja solução é tão fora da caixa que temos de fazer comparações dentro do jogo (coff puzzle do luminol coff).
Coisas não tão boas:
- Voice acting: Certo, é um estúdio indie que lutou bastante para ter este jogo cá fora. Mas os diálogos das personagens têm pouca emoção. Para além disso, as interjeições quando a entidade se manifesta muitas vezes deram-me ataques de riso (desde “OH MY GOD” até um “Hmmmm” bem agudo).
- Reação à perda das personagens: Sim, matei umas quantas personagens pelo caminho. Mas não ouvi nenhuma das outras dar pela falta delas. Parece que nunca existiram naquele mundo.
- Câmara fixa: Algo a que já estamos habituados em jogos de terror, mas nunca vou deixar de odiar. Jogar com câmara fixa pode ajudar a aumentar a tensão (nunca sabemos o que está ao virar da esquina), mas o atrofio que me dá com os comandos quando de repente a câmara está posicionada no fim do corredor dá-me mais frustração que o necessário.
- Glitches: Há uns quantos glitches que tiram um bocado a imersão do jogo. Por exemplo: o Daniel estava a segurar uma lanterna, dava dois passos, ele mexia-se, mas a lanterna ficava suspensa no ar no mesmo sítio onde estava; com a Erica, a entidade tenta entrar por uma porta (que normalmente dá origem ao mini-jogo do “vamos fechar a porta na cara do inimigo”), mas ela disse “I need to hide!”. Ou seja, eu fugi… e faleci. Bye bye Erica.
Pontos mais que positivos:
- Slow burner: Song of Horror é daqueles jogos que demoram até extrair o sumo. Para alguns jogadores isto é frustrante, mas para mim é o necessário para criar o ambiente inquietante que este jogo nos oferece.
- Banda sonora: As cordas que criam uma aura misteriosa com cada passo aumentam a tensão exatamente nos sítios certos. Os próprios efeitos sonoros ajudam nesta missão.
- Permadeath: Adorei esta mecânica. Estou habituadíssima a percorrer cada canto e a abrir cada porta. Com a promessa de insta-morte atrás de cada objeto, tive de pensar duas vezes se realmente valia a pena tentar falar com o fantasma do personagem falecido (sim, que eles podem aparecer para nos dar items… ou levar-nos com eles para o além).
Conclusão:
Song of Horror não é um jogo perfeito, mas é muito capaz. Tem uma boa dose de terror e suspense sem ser demasiado para os mais sensíveis, e mecânicas inovadoras para quem já está habituado a jogos de terror. A Complete Edition vale muito a pena para os fãs do obscuro.
Song of Horror: Complete Edition está disponível para PC, PlayStation 4 e Xbox One.
Com 5 anos meteu as mãos numa cópia de Tomb Raider II e a partir daí o encanto pelos videojogos só aumentou. Joga maioritariamente RPGs, acção/aventura e terror, tendo um carinho especial por jogos “Choose your own Adventure”. Fangirl da Sony, mas quando ninguém está a ver vai jogando no computador.