Gameverna – Coleccionar vs Jogar

É claro que uma colecção é um conceito completamente subjectivo ao observador.

Quem só tem 5 jogos em casa e veja um amigo que tem 50 vai pensar “este gajo é ganda maluco, tem uma colecção enorme de jogos em casa”. E possivelmente num tom pejorativo ainda acrescenta ao seu julgamento “não deve fazer mais nada da vida”. Ora, o que diria essa pessoa obviamente normal, apesar de já ter corrido todos os psicólogos do distrito e serem todos maus profissionais, de alguns de nós? Claramente que precisamos de ajuda profissional ao nível planetário, estamos obcecados e nunca vamos conseguir nada da vida, somos uns falhados, nunca vamos deixar de ser umas crianças e até morrer vai ser a nossa querida mãe a barrar a manteiga nas sandes. Provavelmente somos obesos, temos diabetes e crostas no rabo por estarmos sempre sentados em frente a um ecrã a jogar, com pelo menos sete pacotes diferentes de batatas fritas ao lado, três tipos de refrigerantes de dois litros cada e quatro tabletes de chocolate. Bem, não quer dizer que isso até não aconteça em certos casos – fotos de casos reais até seriam bem vindas, menos dos rabos – mas no geral não podia estar mais longe da verdade. Aliás, um dos maiores problemas que vejo em pessoas que coleccionam videojogos, é que praticamente não jogam. Mas agora podem argumentar que quem colecciona selos também não os vai usar para mandar cartas, só olha para eles. Certo, totalmente correcto, no entanto os videojogos têm a particularidade de poderem ser utilizados sem os perdermos para sempre, como um coleccionador de carros ou de relógios faz uso do seu espólio.

Isto foi uma questão que me assombrou à uns meses. A ideia de coleccionar, numa fase inicial, era simplesmente ter mais jogos para experienciar, quando passou a ser coleccionismo para ter na prateleira (que nunca foi intencional) tornou-se num dilema. Para quê gastar dinheiro se não vou tirar partido do investimento? A todos nós adultos a quem custa a ganhar o sustento, certamente já nos deparamos com este pensamento numa ou noutra situação, independentemente do tipo de artigo. Agora todos vocês olharam para o vosso smartphone e pensaram “porque é que eu gastei 1000€ se só envio mensagens pelo whatsapp e falo ao telefone?! De vez em quando lá mando uma foto do genital mas aí uma câmara mais foleira até podia ser algo benéfico”. Exacto, é idiótico, para 95% das pessoas telemóveis topo de gama é completamente inútil. Mas, é o fenómeno do Swag, é importante mostrar que se tem, cada vez mais no mundo de hoje. Aqui à 20 anos atrás a extensão do órgão sexual era o carro, agora é o telemóvel, bem mais acessível e só demora 24 meses a pagar em vez de 120. Mas isto tudo para podermos chegar à conclusão que, já que gastamos dinheiro em jogos faz sentido tirar partido deles. Foi com isso em mente que passei a comprar muito menos coisas para a minha colecção, apenas o que tenho interesse em jogar num futuro próximo ou imediato. Além disso dedico mais tempo a esse hobby em vez de ficar a ver Netflix no sofá a noite toda como uma pessoa normal. E, honestamente, tenho tirado muito mais partido da minha colecção, mas tenho também sentido que aproveito muito melhor o meu tempo com aquilo que realmente gosto. E acreditem ou não, a disciplina é importantíssima na vida e organizar melhor o meu tempo livre levou-me a organizar também melhor as tarefas diárias, o que, devo dizer, teve também um impacto positivo no psicológico. Ou seja em resumo gasto menos dinheiro, poupo espaço, sou mais organizado, não perco tanto tempo a contar bezerros e faço mais daquilo que gosto.

Mas e os jogos que já estão na colecção? Agora o mal está feito, não posso voltar atrás, vender os que não quero jogar seria desistir, um sinal de fraqueza… Mas a missão de aproveitar o investimento não pode ir por água abaixo, agora vou ficar obcecado com o conceito de ter de acabar todos os jogos que tenho! Afinal talvez precise de ajuda. Mas calma, isto com um bocadinho de matemática básica podemos tentar perceber o impacto que esta obsessão poderá vir a ter nas nossas vidas se quiserem seguir o meu caminho. Ora bem assim por alto se eu jogasse duas horas por dia – O que é basicamente impossível no meu caso por motivos pessoais e profissionais – quer dizer que ia demorar mais ou menos 31 anos a finalizar todos os jogos que não acabei. Ok, já não é talvez, vou mesmo precisar de ajuda, possivelmente universal ao invés de planetária. Mas é nestas coisas que a factualidade matemática e a obsessão desmesurada têm de ficar de lado para dar espaço à racionalidade e ao senso comum. O que acabará por acontecer é que vou passar algum tempo com os títulos que realmente valem a pena, e pouco tempo com outros que por um ou outro motivo não me cativam. Não me irei forçar a finalizar algo só porque sim, só por obsessão. E se tiver de fazer batota em alguns jogos porque o meu tempo neste mundo é importante assim o farei. No fim, com isto tudo, a mensagem que gostaria de deixar é tão simples como – é saudável fazermos tudo com peso, conta e medida. E nunca se esqueçam que é muito importante não olharmos para o que os outros fazem mas sim para o que nós queremos fazer para nós e por nós. Se eu quero ter vidas infinitas num jogo horrível de commodore 64 por piada então vou ter, se vocês não quiserem, então não tenham, o importante é que todos nos divirtamos com os nossos hobbies, e que aproveitemos o tempo que aqui andamos da maneira que nos faz sentir melhor.