Lost Words: Beyond the Page – Palavras para quê?

Há poucos jogos que me deixam com a sensação de missão cumprida. Lost Words: Beyond the Page foi um deles.

O meu primeiro ponto de contacto com Lost Words: Beyond the Page foi o seu trailer de lançamento. Bastaram-me 18 segundos para ficar interessada: uma narração com voz suave, um visual agradável, o desenho de um tubarão-baleia e referência a bioluminescência no mar foi o suficiente para querer jogá-lo (o que posso dizer, eterna apaixonada pelo mar!).

Lost Words: Beyond the Page é a primeira obra-prima da Sketchbook Games. No site afirmam: “acreditamos que os videojogos são dos meios mais poderosos para contar histórias e usamo-los para criar experiências únicas e comoventes”. Depois de experimentar este jogo, não tenho como não concordar. O enredo é brilhantemente escrito por Rhianna Pratchett, cérebro por trás de outras histórias conhecidas no mundo dos videojogos (como Heavenly Sword, Mirror’s Edge, Thief e Rise of the Tomb Raider – este último nem é dos meus jogos preferidos nem nada!). Mas curiosamente, não é só de palavras que este jogo vive.

Tubarão-baleia

O jogo imediatamente apresenta-nos Izzy – uma rapariga que recebeu um diário da sua avó e que ambiciona ser escritora. É notório que ambas partilham um laço muito forte, e a história que Izzy quer desenvolver é algo que ela planeia orgulhosamente mostrar à avó. Mas esta não seria uma história tocante sem alguns percalços pelo meio.

É aqui que começamos a ver a verdadeira estrutura de Lost Words. Existem duas histórias que vamos descobrindo em paralelo: a de Izzy, e a da “Guardiã dos Pirilampos”, personagem criada por ela para a sua primeira história. Apesar de se complementarem, são dois modos de jogo tão diferentes que, separados, podiam ser dois jogos (curtos, mas) distintos.

Enquanto Izzy, ouvimos os desabafos dela enquanto percorremos as páginas do diário. Vamos aprendendo mais sobre a ternurenta relação com a avó, a dinâmica familiar com os pais e o irmão mais novo, e como ela se sente à medida que um terrível acontecimento se abate sobre todos eles. Acaba por ser um exercício sobre a resiliência de uma criança e uma demonstração de que por vezes as palavras, por mais familiarizados que estejamos com elas, simplesmente não saem.

Aqui o jogo é relativamente simples, focando-se num estilo de plataformas em 2D. Controlamos uma versão miniatura de Izzy a saltar de frase em frase, por vezes ordenando umas quantas palavras para preencher os vazios e mudá-las de sítio na página, servindo também como plataforma para nos levarem à próxima (e apanhando alguns colecionáveis pelo meio, que nos revelam mais alguns pensamentos que Izzy não põe em papel). Por vezes usamos as palavras no seu sentido mais literal – como ter de arrastar a palavra Open para cima de um portão trancado para podermos prosseguir.

Não escolhi esta imagem pelas referências a tubarões. Que ideia.

Enquanto Guardian of the Fireflies, a personagem principal da história de Izzy (que podemos escolher o nome de entre umas quantas opções, assim como a cor do vestido e algumas características– a minha era a inteligente ruiva Robyn), descobrimos o mundo de Estoria na nossa demanda pelos pirilampos sagrados, que foram afastados da sua aldeia natal por um temível dragão. Depois da anciã da aldeia e ex-Guardiã Ava lhe dar um livro com o poder das palavras (literalmente), a “nossa” Guardiã parte na sua aventura.

Apesar de termos novamente um jogo de plataformas, já nos encontramos num ambiente 2,5D. À medida que progredimos na história, vamos escrevendo umas quantas palavras no livro mágico que podemos usar para ultrapassar obstáculos – elevar, quebrar ou restaurar plataformas passa a ser possível se retirarmos as palavras do livro e as passarmos por cima da zona que queremos afetar. Vamos encontrando personagens completamente diferentes umas das outras com as quais teremos que lidar para conseguirmos avançar – e aqui o jogo dá-nos algumas escolhas, como escolher o que dizer ou como abordar.

Ler DoggoLingo num jogo deixou-me feliz.

Mas apesar de ser um jogo com um foco no poder das palavras, devo dizer que Lost Words: Beyond the Page se destaca imenso pelo visual e áudio.

Izzy, para além de escritora, tem também um dom para as cores, e ilustra com algumas páginas do seu diário com aguarela. Dei por mim a parar o jogo algumas vezes simplesmente para admirar a beleza destas ilustrações que, apesar de simples, transmitem perfeitamente o estado de espírito da nossa protagonista.

A banda sonora está cuidadosamente escolhida e foi mais uma adição instantânea à minha playlist de música de jogos. Através da performance da Nashville Scoring Orchestra, David Housden transporta-nos de uma maneira perfeitamente subtil para o mundo encantado de Estoria e, quando damos por nós, estamos de volta à cabeça de Izzy. As transições são perfeitas e não há um único momento em que a melodia não se adeque ao momento. Tudo, desde as cordas à percussão, une-se de uma forma tão mágica que parece criada no próprio mundo encantado de Izzy. Brilhante.

Conclusão:

Lost Words: Beyond the Page é muito mais do que parece. É um jogo simples e curto, mas com uma grande carga emocional. Fala-nos dos laços que criamos com quem cruza o nosso caminho, perda, e esperança. Se gostam de jogos que vos tocam o coração, este é um deles – depois das lágrimas, ficamos com um sorriso na cara.

 

Lost Words: Beyond the Page está disponível para Stadia, e a partir de dia 6 de Abril para PlayStation 4, Xbox One, Nintendo Switch e PC.