Videojogos a 80€ – porque (não) os acho caros

A nova geração trouxe novos preços para os videojogos. Mas serão assim tão caros?

Leio, recorrentemente, em grupos da comunidade de jogadores, queixas contra o preço dos videojogos. Essas queixas subiram de tom com o aumento do preço dos videojogos na nova geração, com jogos a atingir os 79,90€. Parece haver um consenso entre os jogadores que os videojogos são demasiado caros, aquando do seu lançamento, com muitos a esperarem uns meses, pelas primeiras promoções, para adquirirem os títulos que ambicionam jogar.

Esta posição é compreensível. Num país onde o salário mínimo nacional é 665€, os videojogos acabam, naturalmente, percepcionados como demasiado caros, sendo o seu custo 12% do que muitas pessoas recebem por mês. Isto é um problema em Portugal. Os mesmos 79,90€, para um francês que recebe, no mínimo, uma quantia superior a 1.500€ por mês, já não parecem assim tão caros. De igual forma, para um estudante que não aufere rendimentos, 79,90€ são uma fortuna e, de forma a conseguir jogar tudo o que quer, é preciso procurar formas alternativas, nem sempre legais, de colocar as mãos nos últimos títulos do mercado. Para um trabalhador, com um bom salário, 79,90€ pode ser o seu capricho mensal, sem peso significativo no orçamento.

Depois há a percepção que é tudo uma questão de timing. Todos sabemos que, mais cedo ou mais tarde (e será sempre mais cedo que mais tarde), os videojogos baixam para os 40€, sobretudo se os adquirirmos em formato digital, nas regulares promoções das lojas online. Para quê pagar 80€, se posso pagar 40€? Parece a história de comprar um carro novo, que mal sai do stand já está a desvalorizar. O Alexandre, neste seu artigo, escreveu como ele cada vez menos compra jogos a preço de lançamento, esperando pelas baixas de preço.

Sou sensível a todas estas questões e, estando do lado do consumidor, naturalmente que também gosto de ter de gastar o menos possível pelas coisas que pretendo adquirir. Contudo, não consigo, sendo honesto comigo próprio, afirmar que videojogos a 80€ são demasiado caros. Há outras questões a ter em conta.

Os estúdios que desenvolvem os jogos são empresas que precisam de lucrar para sustentar o seu negócio e continuaram a fazer aquilo que tanto desejamos – produzir novos e melhores videojogos. Como qualquer outra empresa de qualquer outra área, os custos fixos têm tendência a aumentar. Salários aumentam, rendas aumentam, custos com materiais aumentam… Ora o preço dos videojogos manteve-se estanque nos 69,90€ durante todo o ciclo da geração passada e, mesmo na anterior, já eram a esse valor. Ora se a PS3 foi lançada em 2007, estivemos pelo menos 13 anos sem aumento no preço dos videojogos. Durante esse período de tempo, quanto aumentou a gasolina, o leite, o pão, a roupa, os telemóveis? Faz parte do ciclo de mercado e seria hipócrita de nossa parte se não esperássemos que o preço dos videojogos levasse uma actualização mais cedo ou mais tarde, de forma a acompanhar também o aumento dos seus custos de produção.

Isto justifica o aumento, para o lado de quem faz os jogos e quer lucrar com isso. Mas nós somos jogadores e essa conversa não nos interessa para nada. Os videojogos são muito caros, não quero pagar tanto e não acho que valem esse valor. Ok, percebo. Eu também prefiro gastar o menos possível com as coisas que pretendo comprar. Mas recuso-me a afirmar que os videojogos não valem 80€ (pelo menos a maioria deles).

Vamos fazer uma análise de valor. E aqui, interessa-nos avaliar o valor do nosso entretenimento. Vamos então fazer um cálculo do custo/hora do nosso entretenimento.

Se eu for ao cinema ver um filme, vou pagar 7€ por um bilhete normal (e para efeito destas contas, nem vou pensar sequer em comprar pipocas) por filme de 2 horas. Isso leva a que o meu custo/hora pelo entretenimento de ir ao cinema seja 3,5€. Se eu for jantar fora com amigos e pagar 15€ por uma refeição em que estive 2 horas, estou a ter um custo/hora de 7,5€ pelo meu entretenimento. Se meter uma moeda de 50 cêntimos nos matraquilhos e o jogo levar 5 minutos, o custo/hora é de 6€ pelo meu entretenimento.

Se eu pagar 79,90€ por um jogo que me oferece  30 horas de jogabilidade, o meu custo/hora de entretenimento é 2,60€. Percebem onde quero chegar? E se formos olhar aqueles jogos que nos oferecem perto de 100 horas de jogabilidade estamos a falar de menos de 1€ por cada hora do nosso entretenimento. Acho uma profunda falta de sensibilidade de nossa parte afirmar que um videojogo não vale 80€, quando depois estamos imensas horas a usufruir do produto que adquirimos.

Claro que, como tudo, há alguns jogos que nos oferecem muito pouco (lembro-me de como me senti defraudado com o The Order 1886). É tudo uma questão de estarmos bem informados sobre o videojogo que pretendemos. Da mesma forma que não vou pagar 7€ para ir ao cinema ver uma curta-metragem de 5 minutos, não me vão apanhar a pagar 80€ por um videojogo que passado 2 horas está pronto a ser arrumado na estante.

E todos nós queremos mais e melhores jogos, certo? Já há algum tempo, neste artigo, o Gonçalo se tinha debruçado sobre a questão da sustentabilidade para os estúdios de desenvolverem jogos que nos oferecem imensas horas de jogabilidade. Não podemos pagar 6€ por um bitoque e esperar um bife do lombo maturado, a desfazer-se na língua. A indústria dos videojogos têm de ser sustentável, de forma a evoluir e nos oferecer cada vez melhores experiências. E se ela tem evoluído!!! Temos sido brindados com peças de entretenimento que não ficam atrás das produzidas por Hollywood e sempre pagando o mesmo valor por elas que pagávamos há mais de uma década atrás. Estava na altura de ser feita uma actualização no preço.

Os videojogos, a preço de lançamento, para a realidade portuguesa, podem ser considerados caros sim. Mas isso não significa que não podem valer cada cêntimo do seu custo. E se virmos na perspectiva do custo/hora, então, se calhar, até não são assim tão caros. Cabe-nos, a nós, fazer uma análise de quanto estamos dispostos a pagar por cada hora do nosso entretenimento e avaliar, com racionalidade,  que jogos estamos dispostos a adquirir no lançamento, mais tarde em promoção ou nunca.