GameJam+: SideQuest acompanhou a etapa da Figueira da Foz

O GameJam+ é uma maratona mundial de desenvolvimento de jogos, que conta com a participação de jovens apoiados por mentores experientes na área.

Saindo de Lisboa cedo, com destino à Figueira da Foz, sem perceber bem o que esperar para além da GameJam+ (que já nos é muito familiar e querida) pois havia toda uma sequência de acontecimentos previstos durante os 3 dias: assinaturas de protocolos entre entidades e o movimento Digital Valley Portugal, presenças confirmadas de autoridades como o Secretário de Estado da Internacionalização e o próprio Presidente da Câmara, com interesse em tornar o seu concelho o primeiro GameDevFriendly de Portugal, encontros com desenvolvedores de jogos que iriam dar mentoria aos jovens participantes, diversos CEOs e celebridades como o jornalista esportivo Guto Nejaim.

Mesmo diante dessa pauta extensa, ocupando toda a agenda dos dias 14 a 16 de outubro, o que realmente brilhou foi o talento dos jovens ali presentes, criando em poucas horas do zero sistemas base de videojogos para talvez virem a disputar a final continental que será em Portugal em abril de 2023 e a final mundial no Rio de Janeiro, Brasil, em julho do mesmo ano.

A dedicação e capacidade dos meninos e meninas, miúdos com idades entre 11 e 20 e tal anos, impressiona. Tive a sorte de acompanhar de perto parte dos processos de mentoria e as equipas a trabalhar em seus projectos, positivamente uma experiência para a vida. Cinco equipas de sete pessoas cada com os seguintes códigos: Enterprise, Endeavour, Atlantis e Discovery com jovens alunos da Code.Up e a equipa Estrelinha com participantes mais experientes do Game Dev Tecnico de Lisboa.

O palco desse acontecimento foi o chamado “Quartel da Imagem”, um antigo prédio dos bombeiros recuperado e transformado num museu da fotografia contendo equipamentos e imagens belíssimas do fotógrafo local Manuel Santos. Não pude deixar de registar esta entre as expostas.

Quartel da Imagem, Figueira da Foz

 

Na cerimônia de abertura de GameJam+, o Presidente da CM Pedro Santana Lopes declarou querer estar “na rota de uma cidade conhecida pela inovação e capaz de captar e fixar talentos, um território com os olhos postos num presente com futuro, que é o das indústrias criativas digitais. Sentir muita alegria no peito por estar a respirar futuro”.

O Secretário de Estado da Internacionalização Bernardo Ivo Cruz frisou “o papel cada vez mais preponderante desta era da digitalização e da gamificação como sendo decisivo para estratégia governativa de criação das condições necessárias para implementação deste ecossistema em Portugal. Incentivar a literacia digital, premiando a inclusão e a igualdade de géneros, sem esquecer o gap geracional, desenvolvendo estratégias de proximidade e de acompanhamento, asseguram a realidade presente e futura”.

Dr. Bernardo Ivo Cruz em discurso de abertura da GameJamPlus

 

A CEO do Digital Valley Gorete Lopes declarou “a importância de movimentos como este, envolvendo a sociedade, universidades, politécnicos e escolas, para ajudar a ligar conselhos e desenvolver estratégias de âmbito nacional, tanto em Portugal continental como nas ilhas e países lusófonos com quem estamos a estreitar ligações”.

Gorete Lopes, Digital Valley Portugal

 

Deram ainda depoimentos o CEO da RealFevr Fred Antunes e da RedCatPig Marco Bettencourt, importantes empresas portuguesas que fizeram questão de estar presentes para assinatura dos protocolos e depois para a mentoria dos concorrentes, ao lado de outros desenvolvedores locais de reconhecido talento como a Vera Peneda, Pedro Lemos e do Hugo Sousa representando a Critical Software de Coimbra. “Há muito potencial nestas game jams, são jovens muito dedicados a produzir projectos de qualidade. Serious gaming é uma área de muito interesse da nossa empresa”, comentou o Hugo. Outros nomes se juntaram como mentores ou apoiadores, como Ricardo Flores (Lockwood), Carlos Mora (Techframe) e David Carvalhão.

 

 

 

 

Antonio Durão, CEO da Code.Up foi o mentor que trouxe para o seu município um acontecimento global destes e ofereceu aos concorrentes a oportunidade de conviverem alguns dias com CEOs, empresários, autoridades e desenvolvedores globais de sucesso. Falarei mais sobre isso numa matéria completa em breve aqui no Sidequest, não deixe de acompanhar!

Participou remotamente da abertura Ian Rochlin, CEO do GameJam+ mundial, em transmissão do Dubai, que declarou mmmm, Para além dele a Fernanda Domingues, CEO da FD Comunicação, em transmissão do Brasil que declarou querer ajudar com sua experiência o trabalho do Digital Valley em prol do desenvolvimento de Portugal. Ambos também assinaram protocolos Digital Valley.

Ian Rochlin, CEO da GameJamPlus, em video na abertura do evento

 

Quanto aos jovens talentos, procurei conversar com alguns dos expoentes entre os ali presentes e confesso que foi muito gratificante.

Ines Silva era um dos membros da equipa Discovery tem 14 anos, fã de jogos estilo mistério e player de CS:GO, confessa preferir desenvolver do que jogar. Dona de uma criatividade incrível, entre os 11 – 12 anos cursou uma semana de programação e decidiu seguir nessa carreira: “É uma maneira de fazer arte e de trabalhar em grupo, o projecto começa no papel e depois vejo na tela a continuidade dele a fluir, é divertido e tem futuro. Era bom que tivesse mais raparigas entre os rapazes porém mesmo assim me sinto bem, há bom ambiente e todos se ajudam”.

Suse Abreu tem 20 anos, está participando pela segunda vez de uma GameJam+. Membro da equipa Atlantis, trouxe uma mesa digitalizadora e fez em tempo real pixel art de vários elementos do jogo que estava desenvolvendo. Sua mãe Vera Abreu estava lá e nos confessou também ser gamer, tendo comprado para si com o primeiro ordenado uma televisão e uma consola Playstation 1. “Desde criança a Suse sempre gostou de dragões, dinossauros, desenhar criaturas mitológicas” – disse irradiando orgulho da filha – “Nunca me preocupei com ela nesse ambiente tão masculino pois sempre foi bastante calmo, para além dela ser muito focada nos estudos.” Interessante que antes da universidade a Code.Up detectou o talento da jovem que agora cursa licenciatura em jogos digitais e multimedia no Instituto Politecnico de Leiria.

Pais Gamers, Filhos Developers...

Na foto acima, Carlos Ararat pai de um dos jovens concorrentes. Venezuelano, mora há quatro anos em Portugal e contou à Sidequest que teve uma loja de videojogos no seu país, quando jovem. “Desde miúdo aprendi e gostava de desenvolver em COBOL, VB, VisualFoxPro e agora em Python”, linguagens de programação de computadores. “Aproveitei que meu filho gosta e vim com ele estudar programação, quem sabe um dia realizo meu sonho de programar um jogo de surf”.

Fiquei encantado com o menino Tomás Ferreira de 11 anos (fotos abaixo). Enquanto ele trabalhava incansavelmente durante todos os dias da GameJam+, observei por detrás dele seus pais Diana e Hugo, em especial sua mãe, com olhar vidrado de puro orgulho. Nos confessou que ele desde muito jovem já mostrava interesse pelas tecnologias. Autodidata, aos 4 anos aprendeu sozinho a ler e escrever juntando as letras do teclado do computador. Aos 6 anos viu online um curso de programação em Leiria e causou o caos na sua casa diante da relutância negativa dos pais: “vocês estão destruindo meus sonhos, acabando com a minha carreira”. Os pais, entretanto, apóiam completamente sua vocação e até o levaram para conhecer a escola Code.Up, embora o Tomás fosse muito jovem para cursar as aulas e só o faria, evidentemente, com as devidas regras em casa para não comprometer os estudos: “tem de estudar, ir bem na escola e daí permitimos que ele se dedique ao que gosta”.

Ao fundo os pais Diana e Hugo

Assisti de perto esse incrível Tomás projetar os personagens do seu videojogo, com poderes e animações. Quando ele se cansava, carregava uma partida de Minecraft e construía freneticamente estruturas complexas, isso para desanuviar a mente. Em determinada altura um dos mentores que é o CEO do estudio RedCatPig prestou mais atenção ao seu projeto. Disse então o Tomás à mãe, em voz baixa: “Será que ele está interessado no meu trabalho e quer me contratar?”. A mãe disse que isso não seria possível e ele completou desapontado “Ah, deve ser por causa daquela coisa de direitos da criança”, fato que levou todos nós ao riso. Um fenômeno!

 

Processo de mentoria em andamento na Equipa Discovery

 

Na abertura da GameJam+, mesmo no primeiro dia, são propostos em todo o mundo ao mesmo tempo seis temas, a escolher pelas equipas. Portugal concorre com Figueira da Foz, Lisboa e Leiria. Durante os três dias os jovens livremente se organizam, fazem meetings, dividem tarefas, são verdadeiras mini-empresas a nascer diante dos nossos olhos.

Equipa Atlantis com a Suse Abreu ao centro e os mentores ao lado direito

 

Ao final do terceiro dia da GameJam+, o produto desse trabalho, os videojogos, são finalizados e devem conter um business plan como se fossem ser apresentados a um investidor ou publisher e submetidos a concurso numa plataforma própria. Não posso entrar em detalhes sobre os projectos mas é incrível o que esses talentos são capazes de construir, alguns envolvendo a história das navegações portuguesas, outros físicas complicadas e calculadas em fórmulas intrincadas na lousa disponível…

Storyboard da equipa Endeavour

 

Ouvi um debate interno numa das equipas sobre quanto cada um estava trabalhando e então o mais jovem membro diz: “o trabalho de vocês corre mais ligeiro que o meu pois estou fazendo toda a física do jogo, tenham paciência”. E retomou concentrado seu cálculo de fórmulas e alterações de dados num ecrã.

Pedro Lemos em mentoria na equipa Enterprise

 

De frisar a excelente estrutura que a CM da Figueira da Foz proporcionou ao GameJam+, tanto nas instalações perfeitamente adequadas como nas comidas e bebidas disponíveis frescas e com fartura e também de se louvar o trabalho de todos os envolvidos que contribuíram para o sucesso deste evento. A presença de muitas mulheres também foi importante para vencer o velho mito que esse ambiente é masculino, enquanto o mundo já provou talento e capacidade independentemente de sexo.

Power Woman in Games!

 

Agora é torcer para quer novamente alguns desses jogos cheguem às finais do GameJam+ como em 2022, chegando ao sétimo lugar na final mundial do Rio de Janeiro. Boa sorte a todos e parabéns aos pais por incentivarem esses jovens a empreender e lutarem pelo que acreditam!