The Flash – A DC ainda faz bons filmes quando quer

Como fã de tudo que é super heróis, era obrigatório para mim ver The Flash, um filme que muitos devem saber que foi profundamente marcado pelos seus problemas de bastidores. Depois de tanto tempo no forno, valeu o tempo de espera?  

Como se devem então recordar, e para além das inúmeras controvérsias do ator Ezra Miller, o filme sofreu muitas transformações ao longo de quase uma década de produção, seja com mudanças radicais no argumento ou no próprio universo da DC no qual ele está (ou deveria estar) inserido.  Confesso que é impressionante como, mesmo com essa trajetória tão conturbada, o resultado final consegue ser bastante positivo

Tudo isso porque o diretor Andy Muschietti optou por seguir um caminho simplificado. Ele traz a temática do multi-verso tão em voga no mundo dos super-heróis, com diversas participações especiais e versões alternativas. Contudo, ele usou esses elementos apenas como um “acessório” dentro de uma aventura básica de origem de personagem.  

Só que, ao mesmo tempo em que o filme trabalha muito bem o caráter trágico do protagonista e a inevitabilidade do sacrifício do herói, ele também traz marcas bem claras desse caos que foi a produção e repete os vícios que levaram o universo da DC a a passar por várias reformulações. E embora não sejam falhas que manchem o filme de forma severa, impedem que The Flash vá tão longe quanto poderia ir. 

O maior acerto de The Flash é ser um filme totalmente voltado para o seu protagonista, e é assim que deve ser. Parece algo óbvio certamente, mas as histórias de heróis recentes parecem ter esquecido disso e só estão mais “preocupadas” com participações especiais, easter eggs e sagas imensas. Mesmo sendo um dos últimos filmes antes do encerrar do DC Extended Universe (ainda temos a sequela de Aquaman para o final do ano), ele trabalha muitíssimo bem o herói na sua difícil jornada, pois é somente aqui que ficamos a conhecer de verdade o personagem e acompanhamos a sua transformação em algo que vai além de alguém com poderes e um uniforme meio manhoso Mais do que isso, é ao conferirmos esta sua origem que vemos como ele também é uma figura trágica e como isso é algo decisivo para a sua história. 

THE FLASH

E é aqui está o grande trunfo de The Flash. A ideia de levar o Scarlet Speedster para o passado para tentar salvar a mãe é tanto uma forma de mostrar e mexer com o multi-verso, como também para apresentar sua origem. Tudo isto deu para “consertar” a interpretação de Ezra Miller e dar um tom mais sério ao papel, e ao mesmo tempo deixa claro que a transformação pela qual ele passa ao encarar o seu eu do passado.  

E, por mais que a temática da responsabilidade do herói e a importância do sacrifício sejam temáticas bastante recorrentes em histórias assim, há um “tempero” a mais por aqui ao conectar esses assuntos à tragédia que é inerente a quem decide vestir um uniforme para salvar o planeta. Existe inclusive uma fala do Batman de Ben Affleck logo nos primeiros minutos que deixa claro como as cicatrizes são o que definem esses personagens, e essa é uma lição muito bem trabalhada por este Barry Allen que está a tentar livrar-se das suas próprias cicatrizes. 

A ideia do filme é mostrar uma versão do personagem mais jovem e sem noção. Sem nunca ter perdido os pais, esse Barry Allen do passado não cresceu marcado pela dor e, por isso mesmo, nunca foi forçado a amadurecer e a encarar as responsabilidades da sua outra variante que viajou atrás no tempo (o Flash “original” digamos assim). Achei que o filme trabalha muito bem esse paralelo entre os dois Flashes para construir esse amadurecimento marcado pela tragédia da perda da mãe.  

The Flash & Batman

Mais o filme obviamente tem mais ainda para oferecer, e apesar de todas as atenções estarem voltadas para Flash, temos ainda as personagens de suporte que estiveram muitíssimo bem e que realmente deram um brilho extra ao filme. Primeiro temos então a Supergirl, que apesar da personagem ter uma participação pequena dentro da história, ela rapidamente chama a atenção por ser alguém bem diferente do Superman que tão bem conhecemos. Mais agressiva e desconfiada com a humanidade, ela é alguém que também passou pela tragédia da perda é certo, mas nunca teve a criação amorosa que Kal-El teve com os Kents ou que Barry Allen teve com sua mãe. Mas eu cá adorei ver toda aquela agressividade, pois só o olhar dela dizia tudo. 

Mas provavelmente a maior das participações especiais está no retorno de Michael Keaton como Batman, que voltou ao papel do protetor de Gotham City volvidos mais de 30 anos. Ele provavelmente pode ser considerado até como o “pai” do todo o género de super-heróis que hoje vemos. Além de ser uma interpretação bem diferente do herói que carrega um tipo de cinismo que nenhum de seus sucessores mostrou até então, ele mostra isso muito bem com o peso dramático que o personagem exige. O resultado é um Batman que espelha na perfeição os dilemas de Barry Allen, mas sem ter um aspeto melancólico, dando um “novo” ar para o personagem que conhecemos tão bem. E ao contrário do que muito boa gente previa, Michael Keaton não rouba o filme para si. Mesmo sendo um dos destaques do filme, ele está ali para servir o Flash e cumpre bem esse papel com bons diálogos, para além de grandes cenas de ação que tão cedo não vou esquecer. Contudo, para mim, o Batman de Ben Affleck continua a ser a versão que mais gosto, e apesar do pouco tempo de ecrã que teve no filme, as cenas onde ele entrou estavam simplesmente brilhantes. 

Uma das coisas que menos me agradou em The Flash foram os efeitos visuais. A título de exemplo, praticamente logo nos primeiros minutos do filme, vemos Flash a salvar bebés em queda de um hospital (que mais parecem figuras de cera), o CGI está simplesmente terrível, e se comparasse com um grafismo de consolas, estaríamos a falar de uma Playstation 2. As cenas de corrida também podiam estar melhores, tudo parece artificial e feito à pressão, como se não tivesse havido um controlo de qualidade. Mas pronto, é mesmo para “matar” o DCEU…, portanto a equipa de CGI estava-se nas tintas provavelmente. 

Flash & Supergirl

The Flash está longe de ser aquele filme revolucionário e nem se propõe a isso. Ele acerta no que é importante ao mesmo tempo em que esconde as marcas deixadas por todos os contratempos pelo qual passou. É um excelente filme que mostra o potencial existente no famoso herói da DC e que o agora condenado à aniquilação DC Extended Universe nunca soube aproveitar na perfeição. Eu cá espero que o Scarlett Speedster retorne, basta que James Gunn (o novo patrão dos filmes da DC) tenha vontade para fazer isso também.