Agatha Christie – Murder on the Orient Express | Análise

Nos últimos tempos andei com vontade de jogar jogos que envolvessem mistérios e uma trama cativante. Já tinha o interesse de experimentar o mais recente jogo baseado nas obras da rainha do crime, Agatha Christie – Murder on the Orient Express.  Desde já posso adiantar que foi uma agradável surpresa e uma companhia perfeita para o período festivo do Natal e Ano Novo. 

Esta não é a primeira adaptação para os videojogos deste clássico da literatura da escritora britânica, mas traz consigo uma interessantíssima abordagem de um dos casos mais mediáticos do detetive belga Hercule Poirot. 

A trama tem umas pequenas diferenças do original, sendo a primeira relacionada com a data, pois desenrola-se em Dezembro de 2023, invés de 1934. O Expresso do Oriente está prestes a completar 140 anos de existência, e a nossa aventura começa com um pequeno prólogo (que serve de tutorial), no qual o carismático Hercule Poirot, ainda no Hotel Tokatlian, em Istambul, precisa de dar uma ajuda ao Coronel Arbuthnot, que precisa de recuperar o seu bilhete do Expresso do Oriente que desapareceu misteriosamente do quarto do hotel. 

Para além de jogarmos na pele de Poirot, vamos também a oportunidade de jogar com a sua nova companheira, Joanna Locke, para obviamente desvendar o mistério por trás do assassinato do enigmático empresário Racthett a bordo do Expresso do Oriente. É aqui que o enredo principal verdadeiramente começa, e vamos ter de lidar com todo um elenco de personagens carregadinhas de intrigas, onde cada um deles tem os seus próprios segredos e motivações. Resolver este enigma ao princípio parece bastante fácil, contudo, pelo meio contém com reviravoltas surpreendentes que irão baralhar a vossa massa cinzenta.  

agatha christie: Murder on the Oriente Express - Hercule Poirot
O inconfundível Hercule Poirot

Falando ainda da detetive americana Joanna Locke, ela tem mais que se lhe diga, pois vamos também jogar alguns capítulos que seguem a sua investigação da tragédia familiar que sustenta os eventos dramáticos no comboio. Com a sua atmosfera mais dura e inspirada em crimes reais, os capítulos de Locke fornecem um bom contraste com as investigações mais confortáveis de Poirot. Ao mesmo tempo, eles também permitem que “escapemos” dos cinco compartimentos apertados do Expresso do Oriente, onde a monotonia poderia ter sido um problema num jogo que dura aproximadamente dez horas.  

Além de termos um enredo principal expandido, também temos alguns novos capítulos onde Joanna Locke e Hercule Poirot devem trabalhar juntos para explorar uma nova reviravolta num dos finais mais famosos da história do crime. A história contém poucos cenários dramáticos e não trata de questões políticas ou filosóficas da atualidade, contudo, Agatha ChristieMurder on the Orient Express está lado a lado com as melhores narrativas de alguns dos jogos do ano, pois é capaz de unir tantas histórias, de tantos personagens distintos sem um único furo de enredo. Tem que se dizer que é deveras impressionante. No entanto, existem ainda alguns problemas com o ritmo do jogo e vários dos personagens poderiam ter sido mais explorados. Não é nada de critico é certo, mas mancha um pouco toda a experiência de jogo. 

Poirot a vasculhar tudo o que é canto no Orient Express

A Microids Lyon parece seguir a tendência de muitos jogos de detetives mais recentes que abandonaram a fórmula de point and click do passado e de inventários a transbordar de itens repletos de todos os tipos de detalhes. Em vez disso, devemos acompanhar e conectar uma série de pistas mentais, uma tarefa que rapidamente se torna difícil à medida que a mente de Poirot se transforma numa complexa “teia” tecida de pistas falsas e álibis conflituosos. 

Felizmente, o jogo mantém registo de todas as informações e tarefas num mapa mental que parece inspirado nos jogos mais recentes de Sherlock Holmes. No entanto, não precisamos de conectar os pontos sozinhos, pois em vez disso, teremos por diversas vezes que ajudar Poirot a responder a perguntas relativamente simples sobre o caso, verificar um álibi ou recriar uma sequência de eventos. Enquanto a maioria dos outros jogos permite que sejamos nós a estar no lugar do protagonista, em Agatha Christie – Murder on the Orient Express parece mais que estamos a seguir os passos de Poirot, cujo pensamento está sempre não um, nem dois, mas sim três passos à frente. 

A detetive americana, Joanna Locke

Um dos pormenores que tenho ainda de referir são os quebra-cabeças, que muitas vezes se tornam demasiado monótonos ou triviais. Nunca iremos ficar presos por muito tempo e, embora os quebra-cabeças não coloquem a nossa massa cinzenta a funcionar a 100% (diria a 70% vá), eles mantêm-nos alerta, permitindo assim que acompanhemos o funcionar da mente do famoso detetive. Pelo menos até meio do jogo, já que a Microids Lyon “puxou o travão de mão” e do nada introduziu alguns quebra-cabeças muito complicados e que retardam o nosso progresso drasticamente. No geral, a curva de dificuldade é muito desigual. 

Agatha Christie – Murder on the Orient Express é um jogo com muita narrativa, dedução e resolução de quebra-cabeças. Não temos gráficos de um Red Dead Redemption 2 por exemplo, mas são razoáveis o suficiente para agradar os nossos olhos, com um desenho de personagens que está no meio termo entre realismo e banda desenhada diria. Já o trabalho das vozes é muitíssimo bom e merece também ser mencionado, bem como as músicas em background, que apesar de não terem muita variedade, transmitem muitíssimo bem o clima de mistério e intriga que o jogo precisa. 

Conclusão:

Agatha Christie – Murder on the Orient Express é um jogo que teve um orçamento limitado, isso é um fato. Contudo isso não impediu que o estúdio francês produzisse um jogo repleto de amor pelo material original. O jogo captura muitíssimo bem o comportamento simpático (quase cómico) e confiante de Hercule Poirot, e o seu bigode bem aparado geralmente é o centro das atenções – podem inclusive encontrar bigodes dourados em cada capítulo que funcionam como itens colecionáveis. É um jogo que quando saiu há uns meses atrás certamente passou despercebido, mas se gostam de romances policiais ou jogos de detetives, este é um jogo que não podem perder.