Wanderlust: Travel Stories – viajar, mesmo quando recluso em casa

Wanderlust: Travel Stories é um jogo narrativo, que constrói uma ponte entre os videojogos e os livros. Mas é uma viagem em que queremos embarcar?

Wanderlust: Travel Stories é uma experiência diferente do que a maioria dos videojogos nos oferece, desenvolvida pela Different Tales, estúdio fundado por dois antigos developers do primeiro jogo do Witcher, da CD Projekt RED, Artur Ganszyniec e Jacek Brzeziński.

Apesar de usar algumas mecânicas familiares de outros jogos, nomeadamente o choose-your-own-quest, terão de ter em conta que se trata, acima de tudo, do contar de estórias sobre viagens, numa narrativa com mais de 300.000 palavras e inspirada em testemunhos reais de viajantes.

Numa altura em que devemos fazer o nosso isolamento social e as viagens estão restringidas, Wanderlust: Travel Stories aparece como candidato a preencher o espaço de duas coisas que enchem a alma a alguns de nós: um bom livro e uma boa viagem.

O jogo… hmmm, ou melhor… a estória começa quando 5 desconhecidos se cruzam num pub na Ilha da Páscoa: Adilia de Portugal, Henry e Henriette (pai e filha) do Reino Unido, Martine da Alemanha e Tomek da Polónia. Reconhecendo os seus espíritos de viajantes, decidem passar a sua estadia na ilha juntos, de forma a partilharem entre si os momentos de viagens que mais os marcaram.

Cada estória passa-se num ponto diferente do Mundo e acompanha o seu interveniente numa fase diferente da sua vida. O texto flui no lado esquerdo do ecrã, acompanhado por imagens de fundo e música que ilustram bem a narrativa. Vamos sendo confrontados com escolhas que irão ramificar a narrativa e impactar, consoante a estória, variáveis como estado de espírito, stress, fadiga ou budget. Poucas vezes sentimos que as escolhas feitas são realmente relevantes para o decorrer da narrativa, mas vão-nos mantendo mais envolvidos na leitura.

Os heróis da narrativa não são, contudo, os viajantes. Os verdadeiros heróis são as emoções neles despoletadas pelas experiências vividas. O verdadeiro viajante vai reconhecer e valorizar este ponto, pois sabe que não é a fotografia com Machu Picchu de fundo que importa, mas sim o que ele sentiu durante o percurso para lá chegar e aquele momento de imersão, quando sentado, ao fim de tarde, contemplamos a antiga cidade e sua envolvência, já depois dos turistas partirem.

A escrita é muito boa e as estórias cativantes, agarrando o jogador/leitor desde o primeiro momento. Tratando-se Wanderlust: Travel Stories de um “quase” livro, a qualidade da escrita era fundamental e encontra lugar ao lado de variadíssimas obras literárias – localizações interessantes e personagens ricos, numa narrativa que faz um excelente trabalho de evocar os sentimentos escondidos por trás dos vários momentos das aventuras que nos conta. A mistura da escrita com os sons e imagens dos ambientes cria um objectivo interactivo muito interessante, que eleva o acto de leitura para outro patamar de envolvência.

Conclusão:

Wanderlust: Travel Stories não é para todos.  Mas, se gosta de ler e, sobretudo, se gosta de ler livros de viagem, acredito que vai gostar. O jogo consegue capturar bem a essência de viajar. A sua mistura muito feliz da escrita imersiva com os ambientes e as mecânicas de interacção, produz um objecto muito interessante. Neste tempos de isolamento social e por um valor pouco superior a 10€, pode ser uma boa solução para matar saudades de viajar.