Transport Fever 2 – ter o monopólio dos transportes

Transport Fever 2 transporta-me (pun intended) para as horas a jogar Transport Tycoon. Será este título o renovar do género?

Transport Fever 2 está, desde final de Fevereiro, disponível para Mac OS. Por motivos profissionais, uso um Mac em vez de PC. Quando vi que este jogo, existente desde 2019 para Windows, tinha sido portado para Mac, não perdi tempo em focar nele o meu interesse.

Há mais anos do que eu gostaria de admitir, o Transport Tycoon era dos meus jogos preferidos. Eu era um aficionado de jogos de estratégia e gestão e despendia horas e horas do meu tempo enquanto magnata dos transportes, desenvolvendo a minha empresa através das várias décadas do jogo. Tenho muito boas memórias desse jogo e, ao ver a oportunidade de voltar a mergulhar no género, num jogo semelhante e com gráficos actuais, não hesitei.

Transport Fever 2 é desenvolvido pela Urban Games e publicado pelo Good Shepherd Entertainment. O seu antecessor, de 2016, foi um caso de sucesso e a fórmula foi repetida neste novo título.

Para quem não é familiar com este tipo de jogos, nós estamos a trabalhar no espaço “invisível” de um Sim City, os transportes. Em Transport Fever 2, jogamos sobre um mapa gerado, já com as cidades, indústrias e comércio nele criadas. O que nos compete é alimentar essas cidades com uma rede de transportes que sirva as suas necessidades. Se o fizermos da forma correcta, essas cidades vão crescer perante os nossos olhos, atraindo pessoas para trabalhar nas industrias às quais estamos a fornecer matérias prima e enriquecendo com os negócios aos quais fizemos chegar os seus produtos. Em troca, alimentamo-nos desta prosperidade, não só com o lucro do transporte das mercadorias, mas também fazendo as pessoas chegar aos seus locais de trabalho ou a outras cidades também em desenvolvimento.

Recebemos dinheiro quando entregamos com sucesso pessoas ou mercadorias ao seu destino. A quantidade a receber varia consideravelmente, dependendo do tipo de carga e da distância que percorreu até chegar ao seu destino. Mas isso não é o lucro, pois temos de ter em consideração os custos de circulação e manutenção da linha (e por linha refiro-me genericamente à rota entre origem e destino). O segredo do sucesso em Transport Fever 2 é conseguir o transporte da forma mais eficiente do ponto de vista de custos, de forma a optimizar o lucro. Usar camiões, por exemplo, é bastante barato, mas também lento. Já usar combóio é bastante mais rápido, mas, derivado aos seus custos, só se torna lucrativo se tivermos quantidades maiores a transportar.

A grande gratificação em Transport Fever 2 vem de encontrar as soluções mais eficientes. Uma só linha de combóio que carrega os vagões no seu percurso tanto com carvão como ferro, para no final da linha os entregar a uma fábrica e recolher aço fabricado para o percurso de regresso, por exemplo, é a perfeição.

Para fazer tudo isto, servimo-nos de mais de 200 veículos realisticamente modelados, entre carroças, combóios, autocarros, camiões, aviões e barcos, suportados por estações, aeroportos e portos modulares. Tudo isto, abrangendo mais de 170 anos de tecnologia de transportes, historicamente fidedigno.

O jogo pode ser jogado de duas formas: campanha ou modo livre.

Temos três campanhas à nossa disposição, com voiceovers  e cutscenes, que nos permitem experienciar alguns dos grandes desafios logísticos dos transportes desde 1850 até hoje.  Aqui temos uma história que nos vai guiando e dando objectivos a concretizar, através de uma série de missões. A campanha vai servindo também de tutorial para os mecanismos do jogo. Está bem desenhada e oferece um leque bastante variado de missões.

Contudo, sendo um dos propósitos do modo oferecer um tutorial, penso que acaba por fazer um trabalho fraco a explicar os mecanismos essenciais que movem o jogo. Por exemplo, é, durante muito tempo, difícil perceber, de forma clara, o fluxo de circulação dos materiais e pessoas. Essa falta de clareza é reforçada pelo facto que os bens a transportar, sejam eles pessoas ou carga, não são revelados até a linha estar operacional. Mesmo a descoberta de alguns elementos do interface, que permitem uma melhor análise da rentabilidade e estatísticas da linhas, são deixadas para nós, sem explicações prévias.

Esgotada a campanha, temos o modo livre, o verdadeiro sumo de Transport Fever 2. Aqui, um mapa gerado, que pode ser gigante, é uma autêntica sandbox. Cabe-nos escolher onde e como intervir, de forma a aumentar as nossas receitas e ver o mundo desenvolver.

Mas neste modo, onde eu devia encontrar a maior diversão, é onde algo muito importante falta (para mim): competição. O que muito me movia no clássico Transport Tycoon eram as outra companhias competidoras. Por um lado, competíamos pelo topo do ranking das empresas de transportes. Por outro, competíamos no mapa por ligações rentáveis. Se demorássemos demasiado tempo a investir em determinada zona do mapa, arriscávamo-nos a ver outra empresa marcar terreno. Em Transport Fever 2, temos, literalmente, o monopólio dos transportes. E pode ser bastante solitário essa posição. Isto pode ser um elemento muito pessoal, mas a mim afasta-me deste jogo. É o mesmo motivo pelo qual eu não gosto de correr e sou uma pessoa que esteve a vida inteira ligado ao desporto. Sinto falta da motivação da competição, que consigo se for jogar futebol ou basquetebol, por exemplo. O mesmo aqui se aplica. Sem a competição, nada me move a desenvolver a minha empresa de transportes. Se gostas de jogar sem competição, desenvolvendo tranquilamente a tua empresa e o mundo, isto é um falso problema.

O jogo tem alguns problemas menores, como alguns elementos não ligarem bem quando estamos a construir, se não tivermos com o zoom mais aproximado,  ou, como já referi, algumas informações importantes não serem de acesso intuitivo fácil. A única coisa que classificaria como um problema maior é não termos como saber o demand por uma linha até a construirmos. Isso faz com que o nosso negócio passe por alguns momentos de adivinhação e apostas. Contudo, nada disto é grave o suficiente para diminuir a nossa experiência com o jogo. Algumas horas metidas em Transport Fever 2 e já não nos lembramos deles.

Até porque, no geral, o interface funciona. A construção é rápida e fácil. A criação de linhas também. Perdemos pouco tempo nas tarefas de “construção”, libertando-nos para as tarefas de gestão. O mapa pode ser visualizado em esquemas de densidade e volume de tráfego, emissões de gases, entre outras estatísticas. Isto ajuda-nos a avaliar onde estamos a fazer um bom trabalho e onde podemos melhorar e até onde podemos ajudar o ambiente, optando por veículos mais eficientes.

Visualmente, Transport Fever 2 está bastante agradável. Fazer zoom in e ver os nossos transportes percorrerem o seu percurso é bastante gratificante. Não sendo exuberante, o mundo está bem populado e serve bem o jogo. A nível de som, o jogo é acompanhado por uma música ambiente algo genérica, que não representa o que está a acontecer no ecrã. cheguei a jogar com o som desligado e a minha experiência de envolvimento foi similar.

Conclusão:

Transport Fever 2 faz quase tudo bem, dentro do que eu esperava de um jogo do género e será, actualmente, o jogo de referência neste nicho. Matou as minhas saudades de Transport Tycoon. Visualmente bastante apelativo e com um interface que ajuda a agilizar as tarefas do jogo (muito embora falhe em nos ensinar como usar algumas funcionalidades), tem a capacidade de nos absorver durante horas a fio, sem darmos pelo tempo passar. E esse é, talvez, dos maiores elogios que podemos dar a um simulador/jogo de estratégia. Para mim, contudo, essas horas acabaram por ser finitas, pois a ausência de empresas controladas por I.A., para competir no mercado connosco, acabou por me fazer aborrecer e perder a motivação de continuar.