O nome Ninja Theory dificilmente será conhecido por grande parte dos leitores, mas isso não o torna menos interessante.
O estúdio foi fundado em 2004 por quatro sócios, três dos quais ainda se encontram no estúdio, a empresa teve o seu início no ano 2000, sob o nome Just Add Monsters e desenvolveu um jogo de Xbox para a Argonauth Games, que havia adquirido o pequeno estúdio.
Os sócios conseguiram adquirir o estúdio de volta quando a Argonauth faliu mas isso não os livrou de problemas financeiros, com as casas hipotecadas e dinheiro para apenas 3 meses o futuro era incerto. A falência foi evitada a poucos dias de acontecer pela Sony Computer Entertainment, que os financiou no desenvolvimento de Heavenly Sword, no entanto, a ausência de sucesso do título fê-los não cumprir com obrigações contratuais com a Sony, levando-os a perder a tecnologia desenvolvida para o jogo e os direitos, que haviam sido cedidos a troco de financiamento.
Seguiram-se outros projetos menores, depois da equipa de 100 que havia tentado continuar o legado de Heavenly Sword ter sido dividida por vários pequenos projetos, mas foi em 2010 que uma melhor oportunidade surgiu, quando a Capcom escolheu a Ninja Theory para o reboot de Devil May Cry, que apesar de controverso no seu desenvolvimento (o redesenho do personagem principal, Dante, levou que fãs mais extremistas enviassem à equipa ameaças de morte), foi um sucesso comercial e reuniu um bom consenso por parte dos críticos.
O futuro parecia mais risonho mas o caminho não era menos difícil, com o advento da oitava geração de consolas a empresa previu um aumento nos custos de desenvolvimento e produção, o que significaria que as empresas de publicação de jogos e distribuição no mercado seriam ainda mais reservados no que diria respeito a financiar projetos, pelo que a equipa decidiu diversificar o seu portfólio e dividir esforços em vários pequenos títulos, chegando a trabalhar com a Chilingo no tema Fightback.
Em 2013, procurando agradar a empresas de publicação e distribuição, o estúdio dedicou-se a um projeto que fosse de encontro ao que estes pretendiam de um jogo, iniciou-se o projeto Razer, que juntava componentes de combate que combinava combate corpo a corpo com acção e disparos, no qual vários jogadores levariam meses a derrotar um vilão. O projeto caiu no momento quase imediato ao lançamento de Destiny, levando a que a empresa se tivesse de se aliar à Disney no apoio ao desenvolvimento de duas entradas de Disney Infinity, que ajudou ao financiamento do funcionamento da empresa entre 2014 e 2015.
O percurso difícil que haviam percorrido levou a direcção a questionar o porquê de não existir no meio desenvolvimento independente, à semelhança do que se passava na indústria cinematográfica e, com uma equipa de apenas 15 pessoas, lançaram-se no desenvolvimento de algo que em 2016 viria a ser anunciado como Hellblade – Senua’s Sacrifice. Os custos de desenvolvimento e produção seriam inteiramente suportados pela equipa que assim teria total liberdade criativa.
O objectivo estava definido, a equipa queria ocupar o vazio que acreditava existir entre os developers de jogos Indie e os grandes estúdios, lançando um jogo de qualidade AAA, desenvolvido por uma pequena equipa e com um baixo preço de venda ao público e apenas disponível para aquisição digital.
As restrições orçamentais levaram a que tudo tivesse de ser pensado ao pormenor, uma protagonista, um número limitado de inimigos, cenários relativamente pequenos e um jogo com máxima qualidade, com uma jogabilidade viciante mas cuja duração longa teria de ser sacrificada em prol da qualidade e time to market.
Sem os recursos de um grande estúdio a divulgação foi algo que teve de ser bem pensado, não possuindo fundos para publicitar o jogo através dos canais habituais a Ninja Theory optou por cedo começar a construir a sua fan base, publicando diários de desenvolvimento no seu canal de Youtube, mostrando o processo e explicando o que estava a acontecer nos bastidores.
A sequência de vídeos é um olhar único e extremamente interessante sobre o processo de criação de um jogo, desde a sua conceptualização até ao lançamento.
A vontade de criar algo verdadeiramente único e revolucionário está bem presente nos diários, onde toda a equipa revela uma enorme dedicação e entusiasmo na criação do jogo. Creio que o exemplo máximo dessa dedicação é a forma como a editora de vídeo, responsável pelos vídeos dos diários de desenvolvimento, passa a ser modelo provisória para a personagem de Senua, sendo que o seu trabalho foi tão convincente e intenso que a direção criativa se viu incapaz de seleccionar uma actriz para representar definitivamente o papel, sendo que a modelo provisória passaria a definitiva.
Combatendo seus demónios e medos internos a personagem de Senua, uma guerreira celta, é extremamente cativante, à medida que o jogo progride vamos desvendando o seu passado e o porquê de ter embarcado naquela viagem.
Joguei com parcos conhecimentos acerca do jogo, sabendo apenas que retratava de forma notável o tema da doença mental e que se tratava do trabalho de um estúdio pequeno. Fiquei absolutamente imerso naquele mundo, naquele enredo extremamente cativante e bem escrito. Os cenários estão muito bem elaborados e tudo se conjuga muito bem, as dificuldades e problemas mentais da personagem estão traduzidos numa jogabilidade brilhante, que combina combate corpo a corpo simples, mas eficaz e fluido, com puzzles e descoberta de lore acerca da personagem ou mitologia nórdica.
Não posso deixar de referir o incrível trabalho a nível de som, este é um jogo em que considero obrigatório o uso de headphones, as vozes na cabeça da personagem ganham todo um poder imersivo que chegam a arrepiar, juntando a isso a notável banda sonora, principalmente nos temas guturais de Andy LaPlegua.
Na minha opinião, é um título obrigatório, embora em certos elementos se note a falta de fundos, estes são completamente obliterados na paixão que se sente ter sido impressa no projeto, mas há mais, em 2018 a Ninja Theory passou a fazer parte dos Microsoft Studios, pelo que se espera que as dificuldades económicas fiquem para trás, deixando o estúdio com os recursos necessários para produzir grandes jogos, Senua’s Saga: Hellblade II está na calha e estou em pulgas para saber quando será lançado!
Começou a jogar num spectrum 48k e desde então tem uma paixão por videojogos, não imagina a sua vida sem jogar. Fã de RPGs, First Person Shooters e jogos Third Person, joga na sua PS5, Xbox Series S, PC e Nintendo Switch.